Afastado pela Justiça após MPF apontar tortura em presídios, ex-coordenador Maycon Cesar Rottava (o primeiro à direita), participa de evento com Moro (Foto: Estadão) |
"Como estávamos nus, e fomos
obrigados a ficar enfileirados encostados uns nos
outros, os órgãos sexuais de um preso encostava no
da frente, o que causou muito constrangimento; quem
fez isso foram agentes federais e os GPE
(estaduais); eu vi eles pegando o cabo de uma
doze e introduzindo na bunda de um rapaz; foram
dois agentes, ele estava em posição de procedimento, ou seja, com as mãos na cabeça;
tentaram primeiro introduzir no ânus dele um cabo
de enxada, mas não conseguiram, aí conseguiram
com o cabo da doze; inclusive, eu vi esse rapaz
saindo de ambulância e os médicos atendendo ele". Esse é apenas um dos relatos que instruem a ação de improbidade administrativa assinada por 17 Procuradores da República com atuação no Estado do Pará, pela qual foi obtido o afastamento liminar do Agente Federal de Execução Penal, MAYCON CESAR ROTTAVA, designado pela gestão Sergio Moro, para assumir o encargo de
responsável pela Coordenação Institucional da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária -
FTIP, no Estado do Pará.
A intervenção penitenciária no Pará foi autorizada por Sergio Moro, por intermédio da Portaria nº 676/2019 (publicada em 28/01/2019), por meio do emprego da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária – FTIP, pelo
período de 30 (trinta) dias, para exercer a coordenação dos serviços de guarda, vigilância e
custódia de presos, com apoio logístico e supervisão dos órgãos de administração
penitenciária e segurança pública do Estado.
Fonte: MPF/PA |
Os depoimentos colhidos pelo MPF, no Pará são assombrosos e deixam antever o aspecto doentio dos agentes que foram destacados para o serviço e de quem os escolheu. Em depoimento ao MPF, agentes penitenciários paraenses, horrorizados, chamaram a Força Tarefa de Moro de "Seleção de Psicopatas". Em outro depoimento, o preso relata abusos de natureza sexual: "ouvi de outros presos que os agentes federais acariciavam as partes íntimas de alguns
presos, chegando até a meter o dedo no ânus
deles; isso nunca aconteceu antes, isso não faz parte
de revista, a revista que passávamos era com roupa,
ou no máximo de cueca, e o policial passava a mão
por cima da roupa; nessa abordagem, os agentes
federais e os GPE mandam a gente esfolar o pênis,
ou seja, tirar a pele da cabeça do pênis; os federais
mandam também a gente virar de costa e abrir as
bochechas da bunda, para ver nossos ânus; isso
não ocorreu somente no primeiro dia, acontece em
todas as revistas; somos revistados todas as vezes
que saímos da cela, como por exemplo, quando
alguém vai para enfermaria, pegar o almoço pros
outros presos, por exemplo, e em todas essas
oportunidades tem averiguação pelado no ânus e
no pênis pelos federais; o preso que tem a mente
fraca fica doido".
Esse tipo de intervenção é de responsabilidade do DEPARTAMENTO
PENITENCIÁRIO NACIONAL, em apoio aos Governos de Estado, em caráter episódico e
planejado, tendo em vista a situação carcerária dos Estados Federados, para situações
extraordinárias de grave crise no sistema penitenciário e para treinamento e sobreaviso, de acordo com o exposto pelo próprio MPF na ação.
A Força-Tarefa é composta por agentes federais de execução penal,
agentes penitenciários estaduais e com a Coordenação Institucional que fica responsável pelo
planejamento, articulação, gestão e ação.
Na ação, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL esclarece que no exercício do controle externo
da atividade policial e sistema penitenciário (7ª Câmara de Coordenação e Revisão), vem
recebendo uma série de denúncias de tortura ou, no mínimo, tratamentos cruéis,
desumanos ou degradantes, notadamente no Centros de Recuperação Penitenciária do Pará II e III (CRPP II e CRPP III), Colônia Penal Agrícola de Santa Izabel (CPASI) e Central
de Triagem Metropolitana IV (CTM IV), todos do Complexo Penitenciário de Americano,
Município de Santa Izabel do Pará.
DENÚNCIAS FORAM FEITAS POR FAMILIARES, PRESOS E POR MEMBROS DO CONSELHO PENITENCIÁRIO, PELA OAB E ATÉ POR AGENTES PENITENCIÁRIOS
De acordo com a petição do MPF, mães, companheiras de presos, presos soltos recentemente,
membros do Conselho Penitenciário e membros da Ordem dos Advogados do Brasil que
fiscalizam o sistema penitenciário narram uma série do que chama de "desconformidades", segundo as quais os
preso vem sofrendo violência física pelos agentes federais, pois
estão apanhando e sendo atingidos por balas de borracha e spray de pimenta, de
modo constante, frequente e injustificado, mesmo após muitos dias da intervenção, e
sem prévia indisciplina dos presos; violências morais pelos agentes federais, como
ameaças, intimidações, humilhações, demonstrações excessivas de poder e controle
(como ordem dos agentes federais para ficarem imóveis e em silêncio absoluto, pelo
que, por impossível, apanham), de modo constante, frequente e injustificado, mesmo
após muitos dias da intervenção, e sem prévia indisciplina dos presos; não estão sendo alimentados (veem comida chegando, mas
não é distribuída), ou são alimentados em quantidade e qualidade aquém da mínima
essencial, sem qualquer diferenciação da alimentação para diabético, hipertensos e
docentes, e sofrem privação de água; não estão recebendo assistência a saúde, mesmo alguns
estando feridos, com balas de borracha, ou lesionados em razão da violência física
dos agentes federais – sofrem provação de medicação e tratamento, inclusive presos
com deficiência, HIV e tuberculose; estão em locais sem condições mínimas de salubridade e
higiene, com ratos, superlotação em nível de desmaio e sufocamento, dormindo no
chão; foram privados ou recebem quantidade insuficiente de
materiais de higiene pessoal, são obrigados a ficar pelados ou somente de cueca,
descalços, molhados, e alguns não podendo sair do lugar sob pena de violência,
sujos pelas necessidades fisiológicas; incomunicáveis, sem acesso não somente a visita de
familiares, mas também de advogados, membros da Ordem dos Advogados do Brasil no exercício da fiscalização do sistema penitenciário, e de integrantes do Conselho
Penitenciário.
Segundo os relatos, “Eles não se alimentam direito, eles não têm
um desodorante, não têm um sabonete, não tem nada
de higiene, eles fazem as necessidades deles e se
lavam só com água, e vestem a mesma roupa há 30
dias; no dia em que eles foram transferidos, eles
ficaram 10 horas todos nus no pátio, durante 10
horas sentados no chão, nus, algemados, algemados
não, com a cabeça, com a mão na cabeça sem poder
baixar, no pátio, até serem remanejado pras celas,
meninas, é uma situação lamentável, que qualquer ser
humano que tenha um pouco de coração se emociona,
eu tô desestabilizada, eu já sou advogada vai fazer 3
anos, eu já vim muito pra presídio, sempre atuei na área
penal, e nunca tinha visto na minha vida uma cena como
eu vi hoje, e não é só no presídio, meninas, são em todos
os presídios, tanto na Nova, quanto no CRPP III". Em outro depoimento, um detento que saiu após 3 dias de intervenção relatou que "nos
3 dias que ficou no Centro de Recuperação de Jovens e
Adultos, relata que os presos ficaram sem roupa, sem
comida, sentados na quadra, enfileirados, com a mão
na cabela e joelho na testa, o dia inteiro, de 5 da
manhã até 10 horas da noite, se eles se mexessem
para tentar amenizar a dor nas costas, apanhavam,
quando queriam fazer alguma necessidade fisiológica ... se o agente federal não autorizasse ir
ao banheiro, faziam as necessidades no local."
Em 26 de agosto de 2019, na sede da Procuradoria da República no
Pará, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ouviu, diretamente, sem intermediários, outro
preso libertado no dia 20/08/2019, nos seguintes termos (original, sem tarjas, em anexo):
“(…) os agentes federais já desceram jogando
bomba para dento do bloco que estávamos e outras 2
(duas) viaturas já vieram por dentro da horta, fechando
o espaço, nos encurralando;(...) botaram nós
todos no campo de futebol, mandaram nós tirar as
roupas, ficamos nú, das 07h30min até as 16h45min;
nesse período passamos por tortura, pois
estávamos no sol quente, espirravam spray na
gente, quebraram muitos cabos de vassoura nas
nossas costas; como estávamos nus, e fomos
obrigados a ficar enfileirados encostados uns nos
outros, os órgãos sexuais de um preso encostava no
da frente, o que causou muito constrangimento; quem
fez isso foram agentes federais e os GPE
(estaduais); eu vi eles pegando o cabo de uma
doze e introduzindo na bunda de um rapaz; foram
dois agentes, ele estava em posição de procedimento, ou seja, com as mãos na cabeça;
tentaram primeiro introduzir no ânus dele um cabo
de enxada, mas não conseguiram, aí conseguiram
com o cabo da doze; inclusive, eu vi esse rapaz
saindo de ambulância e os médicos atendendo ele;
não sei o nome dele, mas muitas pessoas viram;
devido o estado que ele ficou, teve que ser recolhido
da casa penal; (...) STIVE
pegou uma tábua com prego, levantou a cabeça do
prego, e bateu com o prego no meu pé, ou seja, ele
inseriu o prego no meu pé direito; me jogaram pra
dentro do bloco com o pé ferido; no dia seguinte, em
vez de eu ter atendimento médico, me torturam (me
deram muita porrada e spray) e jogaram de volta
pra dentro do bloco novamente, sem atendimento;
depois disso, cancelaram nossa alimentação por
quatro dias, ou seja, ficamos sem comida da terça-feira
até sexta-feira (umas 9 horas da manhã da sexta, depois da sessão de spray); (...) na nossa
alimentação, vem tapuru, lavas, camisinha, luva
derretida, pena de galinha, frango cru; a gente come a
hora que eles querem, eles “pagam” (entregam)
comida a hora que eles querem; somos ameaçados
toda hora, com spray de pimenta;
No mesmo depoimento, o preso conta: "estavam fazendo a
gente se beijar, homens como homens, isso
aconteceu com 6 presos; eram agentes federais
que faziam isso; chamavam os presos lá na frente
e faziam os presos se beijar na frente do resto; isso
aconteceu no campo de futebol onde estávamos
concentrados; isso foi na terça-feira, dia 13 de agosto
de 2019; nunca teve esses tratamentos assim, com
os estaduais não, isso começou agora com os
federais".
Em 10 de setembro de 2019, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ouviu, pessoalmente, servidores da SUSIPE que requereram anonimato, pois
temem retaliações, declararam que:
“trabalhamos na Central de Triagem Metropolitana
II; a gente trabalha há bastante tempo, os presos
não desrespeitam a gente; no CTM II nunca teve
uma rebelião, nunca tivemos grandes dificuldades;
lá são destinados criminosos que incidem na Maria
da Penha, idoso por crime sexual, estelionatário, os
presos não são violentos, são tranquilos; lá tem
presos que correm riscos em outras casas penais;
nós temos muitos custodiados presos pela primeira
vez, muitos; não tínhamos problemas lá, pois é uma
demanda muito diferenciada; lá não tem célula de
crime organizado; a intervenção federal chegou lá
na quarta, dia 4 de setembro, de manhã; recebemos
informações do diretor da unidade de que os
diaristas não deveriam trabalhar; depois foram
solicitados a se apresentar lá por ordem da diretoria
da administração penitenciária; no primeiro dia da
intervenção federal, nós servidores fomos barrados
a entrar; depois de insistência, entramos; os presos
são proibidos de receber atendimento técnico; a
Força-Tarefa é quem determina que não se façaatendimento técnico; havia todo um aparato de
agentes federais com aquelas armas imensas;
fomos apresentados ao WILLIAM, chamado de 001,
e o LUCIANO, chamado de 002; eles disseram que
estávamos de férias por 30 dias; começamos a
escutar urros, gritos, foi um horror; momentos
de terror; nunca tínhamos pensado em presenciar
aquilo [choro dos declarantes], foi horrível, eram
gritos; é um campo de concentração; era spray de
pimenta uns 2, 3 dias; os agentes federais
disseram que tinham autorização para “invadir”
qualquer casa penal e “fazer qualquer coisa”;
tivemos alergia com o spray de pimenta, tivemos
bolhas no corpo; uma colega servidora saiu de lá
com nariz sangrando; a gente sentia o spray de
pimenta no ar, sendo que com os presos o spray é
disparado diretamente; o espaço das celas é
fechado, não tem circulação de ar, de modo que o
cheiro do spray de pimenta é insuportável; os
sprays de pimenta são jogados em dias
seguidos, em momentos distintos, sem qualquer
prévia reação dos presos ; os Agentes Federais
disseram que o spray de pimenta era uma forma dos
presos saírem das celas; é um negócio
complemente desmedido; tiram todos os presos das
celas e colocaram no solário; vimos maldade, a
banalização do mal, a forma que os agentes
Federais falam, com prazer daquele sofrimento;
tiraram tudo deles, deixaram eles de cueca, durante
3 dias, e eles estão com 1 muda de roupa,
descalços, sem toalha, as roupas deles foram
jogadas fora, roupa, lençol, e o tempo todo de
cabeça baixa, eles não tem autorização para falar
com a gente, sempre com a mão nas cabeças; noprimeiro dia, eles sempre tinham que andar
agachados; os Agentes Federais dizem que nós não
podemos chamar os presos de “senhor”, mas de
“vagabundo”; lá há idosos de 60 a 80 nos, há idosos
sequelados de AVC; somos orientados a falar que
todas as necessidades médicas estão sendo
atendidas, mas desconhecemos isso; no primeiro
momento, houve balas de borracha; houve disparos
de balas de borracha em direção aos presos; é um
espaço pequeno; em momento algum os presos
reagiram, ameaçaram, não houve nenhuma
hostilidade dos presos antes ou depois desses atos
dos Agentes Federais; temos uma demanda enorme
por atendimento psiquiátrico, antes da intervenção
federal; o que eles estão fazendo é tudo o contrário
de ressocialização, eles estão desconstruindo; os
Agentes Federais retiraram tudo, todas as redes; lá
tem capacidade para 144 presos, sendo que há
atualmente há 472 presos; numa cela para 15
presos, tem 60; recebemos muitas cartas, pois é o
único meio de informações com a família, sendo que
o 002 proibiu as cartas; há uma arrogância extrema
dos Agentes Federais; não autorizaram mais a
presença de redes, e não tem espaço físico para
colocar colchão; agora, no sábado, chegaram alguns
colchões limpos, mas não tem espaço para colocar;
eles entraram com bomba, bomba de efeito moral,
sem que houvesse qualquer reação dos presos; de
longe, nossas roupas ficaram manchadas com o
spray de pimenta, imagine os presos lá dentro; é
muito parecido com cena de holocausto, de campo
de concentração, é muito degradante [choros dos
depoentes]; quem está saindo de lá, está saindo de
cabeça baixa, humilhado, com o psicológico todo abalado; tem familiar com cópia do alvará na mão,
mas tem preso que não está sendo liberado; antes,
na administração estadual, havia respeito; os
Agentes Federais nos orientam, assediam, que
gente tirem fotos dos familiares, narrem situações
comprometedoras contra os familiares, que
dispersem familiares; trabalhamos há muitos anos
no sistema prisional; ouvimos gritos, urros, e tem
idosos lá dentro; dizem que depois vai tranquilizar,
mas não tranquiliza; tem câmeras lá, mas não
funcionam, foram desativadas; o Agente Federal 002
disse que vai dar um tiro num cachorro que fica lá;
tinha um idoso tossindo, e o Agente Federal disse:
“para de tossir, velho, tá pensando que eu vou te
dispensar?” e o Agente Federal jogou spray de
pimenta no rosto dele; há 2 transsexuais lá; e 1
Agente Federal mulher, disse para o preso: “não
rebola na minha frente”.
FONTE: MPF/PA |
SELEÇÃO DE PSICOPATAS
Para os agentes da SUSIPE, foi feita uma "seleção de psicopatas": "parece que fizeram uma seleção de
psicopatas, e deram o direito a eles se
regozijarem nos presos – o que a gente vê é a
banalização do mal; o 001 e o 002 sabem dessas
atrocidades, pelo contrário, eles concordam com
isso – é pequeno lá; o 001 é o WILLIAM, e o 002 é
o LUCIANO; presenciamos muita humilhação das
mulheres, a forma extremamente grosseira, e isso
em espaço aberto; não vimos nenhuma resistência
dos presos, não é uma resposta enérgica a uma
conduta inadequada do preso; senhoras idosas
presas, veem seus anéis, seus perfumes, suas
coisas jogadas fora; é a destruição de sua
subjetividade, da sua personalidade; que sociedade
é essa que a gente está construindo; eles dizem
que estão ensinando respeito, mas eles não
estão ensinando respeito, estão ensinando o
medo; não é uma coisa isolada; na sexta-feira
anterior, houve revista, e não se constatou nada de
errado; antes, havia remissão para leitura, e com a
intervenção federal, eles estão proibidos de ter acesso aos livres; antes, havia autorização para 1
televisão por cela, hoje está proibido – eles vão
pensar em que? Em se matar; eles não podem orar,
na verdade eles não podem nem conversar; a
Comissão de Direitos Humanos ficou retida lá na
frente, depois foram lá no CRF; tudo isso seria
evitado se alguma autoridade tivesse entrado lá; os
advogados na prática não estão entrando lá; não
tem justiça pra essas pessoas? Eles não são
deuses; há um preconceito com a gente do Norte,
nós nortistas, até pelo jeito deles olhares pra gente;
nunca pensamos que íamos viver para ver isso”.
O relato, de servidores da SUSIPE, inaugura nova fase probatória, afirma o MPF na ação, já que antes "poderia haver discurso de que as narrativas de presos e familiares seriam
fantasiosas, tendenciosas ou exageradas, com o fim de terem benefício no seu
estado de liberdade. Mas agora, com depoimentos de servidores da SUSIPE, que,
como todos servidores públicos, possuem fé pública, o cenário fático probatório
ganha maior confiabilidade e credibilidade."
Em 09 de setembro de 2019, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ouviu
familiar de preso, que por temer retaliações, requereu anonimato, e declarou:
“Sou cunhada de um preso, que está no CRF, e a gente
escutou muitos gritos, pedidos de socorro, escutamos
elas falando: “não matam ela”; eles estavam afogando
ela dentro do vaso sanitário; elas gritavam; “não
matam ela dentro do vaso, tira ela”; hoje é que eles
liberaram para levar 1 calcinha, 1 sutiã, 1 toalha e 1
lençol, todo branco; agora, os agentes federais falam:
cala a bora; eles batem muito; elas ficaram nuas na
frente de agentes masculinos e femininas; sai
caminhões e caminhões cheio de coisas quebradas,
como ventiladores quebrados”.
FONTE: MPF/PA |
Segundo o MPF, no dia 04.09.2019 a FTIP ingressou no centro de recuperação por volta das 04h00 da
manhã, soltando bombas, espirrando spray de pimenta e colocando as presas para fora das
celas apenas de roupas íntimas, e que algumas presas ficaram nuas, todas na frente de
agentes federais homens; Várias mulheres relatam que apanharam de cacetetes por parte de agentes federais
masculinos. As presas ficaram sob procedimento, agachadas e amontoadas, com a mão na nuca,
entre quatro e cinco horas; que nesse período ficaram sem beber água, que no primeiro dia
teriam tido apenas uma alimentação por volta das 17h;
5. Que foram colocaram 80 presas numa única cela; que a todo momento ordenaram procedimento de agachamento, estando as presas nuas, que focaram lanternas no ânus.
No dia 12.09.2019, o mesmo grupo de fiscalização deslocou-se para o Centro de
Recuperação Feminino, e desta vez ingressou no bloco das presas sentenciadas. Foram
formadas duplas para atender as mulheres por cela, cujos relatos foram registrados em
vídeos por elas autorizados, com as seguintes denúncias: "1. Que na madrugada para amanhecer o dia 04.09 os agentes da FTIP entraram no bloco
soltando bombas, que foram obrigadas a retirar a roupa e ficaram nuas ou de roupas íntimas
na frente dos agentes homens;
2. Que ficaram muitas horas nessa condição, no chão molhada, sendo “oprimidas e
humilhadas” psicologicamente e fisicamente;
3. Que todas relataram que foram muito agredidas fisicamente com cacetetes, spray de
pimenta, choque elétrico; que foram muito xingadas, chamadas de “porcas”, “sujas”;
4. Que foram retirados todos os seus pertences pessoais e desde então ficaram descalças,
só com um uniforme, sem toalhas, lençóis e colchões, e sem material de higiene, o que tem
causado coceiras;
5. Que ficaram por horas sem tomar água e a comida receberam apenas uma vez em
alguns dias e que vinha crua e azeda, pelo que não conseguiam se alimentar;
6. Várias mulheres estavam com feridas e hematomas, cuspindo sangue; se queixam que
estão apenas com uma muda de roupa, que não conseguem fazer a higiene íntima e estão
com corrimentos;
7. Que muitas foram obrigadas a sentar em cima de urina e fezes de rato;
8. Algumas relataram que foram fotografadas e/ou filmadas, nuas ou em roupas íntimas,
pelos agentes homens da força tarefa;
9. Identificamos várias presas idosas na área da enfermaria com situações graves de saúde,
sendo que uma não consegui abrir os olhos devido ao spray de pimenta e outra com HIV
não estava recebendo a medicação, sendo que ela nem mesmo consegue andar;
10. Uma presa, durante a visita, teve uma crise epilética, na presença da comitiva e foi
retirada da cela pela equipe de enfermagem e levada para a ala de enfermagem;
11. Outras presas hipertensas denunciaram estar sem medicação e algumas com febre
também sem atendimento e medicação;
12. Haveria uma denúncia de que uma das presas estaria grávida e devido às agressões
físicas abortou, tendo sido levada para a Santa Casa em Belém"
LGBT'S SÃO VÍTIMAS DE TRATAMENTO MAIS HOSTIL
Na representação PR-PA-00041098/2019 que deu origem à Notícia de
Fato 1.23.000.001726/2019-28, narra-se que:
DENÚNCIA DE VIOLAÇÕES AOS DIREITOS HUMANOS
POR AGENTES DA FORÇA NACIONAL NO CRF -
ANANINDEUA
Nesta data, compareceram as representantes para
denunciar violações aos direitos humanos praticadas por
tropas da Força Nacional no Centro de Reeducação
Feminina - CRF de Ananindeua, onde suas filhas estão
custodiadas.
As representantes relatam que as detentas estão
sofrendo constantes agressões, com golpes e spray
de pimenta, com tratamento ainda mais hostil para as
presas LGBT`S, o que é o caso das suas filhas. Dizem
que às 4h do dia 04.09.2019 ingressaram agentes da
Força Nacional (maioria homens) no CRF e forçaram as detentas a ficar somente com roupas íntimas e
sentadas com a mão na nuca por longas horas
pronunciando palavras de ordem, sem possibilidade de
deitar para dormir e de sair para fazer suas
necessidades fisiológicas, o que as obrigam a fazer
no local em que estão sentadas.
Também informam que o fornecimento de alimento está
precário, vez que é fornecida somente uma marmita às
15h e as detentas são obrigadas a poupar comida caso
queiram se alimentar novamente à noite, e que o
fornecimento de energia elétrica do local foi interrompido.
É relatado também que escutam nos arredores do CRF
gritos de dor das detentas e de palavras de ordem de
agentes da Força Nacional.
Registram, ainda, que os bens pessoais das detentas,
como lençóis, colchonetes, vestimentas, ventilador,
produtos de higiene, televisão, alimentos e afins, foram
retirados.
Informam que houve uma reorganização que provocou
superlotação nas celas com a desativação do Pavilhão
Primavera I e concentração de todas as detentas no
Pavilhão Primavera II, onde foram colocas de mais de 70
mulheres em celas com capacidade para 12.
Por fim, consignam preocupação com a vida das
custodiadas, vez que há poucas notícias de suas
condições, pois visitas estão proibidas, inclusive de
advogados, desde o dia 05.09.2019, o que deve durar
pelo menos 30 dias, podendo haver prorrogação por mais
30, segundo informação dada pela assistente social do
CRF. Por todo o exposto, solicitam intervenção do
Ministério Público Federal para garantir a dignidade das
detentas e o direito de visita às suas familiares."
PECHA DE DESONESTIDADE ESTÁ "COLADA" NO COORDENADOR DA FTIP
De acordo com o MPF, os fatos explanados constituem "atentado, pela
FTIP, coordenada por MAYCON CESAR ROTTAVA, à incolumidade física dos
presos; submissão dos presos a vexame e a constrangimento não autorizado em lei;
atos lesivos da honra e do patrimônio dos presos, e do próprio Departamento
Penitenciário Nacional, que vê sua imagem (honra objetiva) maculada, tudo em
nítido abuso e desvio de poder."
Os fatos "evidenciam presos feridos,
principalmente de balas de borracha, mas não se evidencia nenhum curativo, não
há registro de nenhum tratamento especificamente a essas pessoas, mesmo sendo
os fatos levados a conhecimento do coordenador da FTIP por Recomendações e
Ação Civil do MPF."
Na verdade, diz o MPF, o Coordenador da FTIP, MAYCON CESAR ROTTAVA, que trabalha em Americano,
passa o dia inteiro lá, coordena a custódia de presos no CRF e CTM II, e possui
poder hierárquico sobre todos ali, sabe do que ocorre na própria casa que
comanda. Não é necessário notificação do MPF para que se inicie sua mora, por
omissão. Reitere-se que o Mecanismo Nacional de Combate a Tortura exigiu
tratamento de saúde (se exigiu, é evidencia de que não está sendo dado), e que há
“Muitos com marcas e cicatrizes de disparos de balas de borracha”.
Por todo o exposto, afirma, "resta evidente que a conduta do requerido
demonstra afronta aos princípios que deveriam nortear sua atuação administrativa, com postura contrária ao ordenamento jurídico, em conduta flagrantemente
atentatória ao princípio da legalidade, além da utilização de equipamentos não
letais em desvio de finalidade."
"O agente público que faz uso de sua autoridade e de bens públicos
para cometer práticas, comissivas e omissivas, manifestamente atentatórias aos
direitos fundamentais de seus custodiados, mediante a utilização de meios
degradantes e arbitrários de punição, omissão de socorro, maus tratos e tortura,
claramente apresenta comportamento dissonante do padrão esperado de qualquer
servidor público. A pecha de desonestidade é evidente diante do menosprezo aos
direitos básicos daqueles que se encontram sob sua guarda.
É de se destacar que, por se tratar de tema de preocupação
internacional, a ofensa a direitos humanos por agente representante do Estado
tende a provocar significativa repercussão na mídia nacional e internacional, de
modo que suas consequências recaem, em última análise, sobre a própria imagem
da administração pública e da boa gestão dos negócios do Estado."
TORTURA DE FORMA INSIDIOSA
A tortura, no presente caso, e em sua maioria, é aplicada de maneira
insidiosa, destaca o MPF, como por exemplo, com restrição de comida, restrição de sono,
interrupção de iluminação (escuridão), superlotação (além da infelizmente já
tradicional, provocando amontoamento de pessoas), não atendimento de presos
machucados ou feridos (inclusive por balas de borracha – causando continuidade de
sofrimento físico), privação de materiais de higiene (o Oficial de Justiça, que atuou
em mandado da MM. 3ª Vara Federal, relatou que o cheiro dos presos sem higiene
é tamanho que os Agentes Federais usam máscara), proibição de ir ao banheiro
(obrigando o preso a fazer suas necessidades fisiológicas em si), agressões
verbais, exigência para que se fique horas em uma mesma posição, no chão,
agachado e com mãos na cabeça (o que provoca dores, cãibras, e desconforto
excessivo, mas não deixam lesões corporais atestáveis em laudo), tiros de balas de
borracha, que nem sempre atingem os presos (o que causa desestabilização
emocional), uso de spray de pimenta de modo desnecessário, desproporcional, e
contínuo (o que, repita-se à exaustão, não deixam lesões corporais atestáveis em
laudo)."
OFICIAL DE JUSTIÇA FEDERAL E EVANGÉLICOS FICARAM SOB A MIRA DE ARMAS E FORAM AMEAÇADOS COM TIROOS DESPARADOS POR AGENTES DA INTERVENÇÃO
OFICIAL DE JUSTIÇA FEDERAL E EVANGÉLICOS FICARAM SOB A MIRA DE ARMAS E FORAM AMEAÇADOS COM TIROOS DESPARADOS POR AGENTES DA INTERVENÇÃO
Não foram apenas os presos e presas e seus familiares as vítimas das torturas e ameaças praticadas pela "seleção de psicopatas" de Sergio Moro. Um oficial de Justiça certificou à Justiça que ficou sob a mira de uma arma que lhe foi apontada por um dos agente da Força de Intervenção no Pará, sob a alegativa de que ele seria uma ameaça aos agentes. Um grupo de evangélicos que pretendiam promover evangelização no presídio foi ameaçado com tiros disparados por um agente que os intimidou para que fossem embora sob pena de os tiros finalmente os acertarem. Os relatos constam também da ação.
JUSTIÇA AFASTOU O COORDENADOR DA FTIP/PA
"Ante o exposto, defiro o pedido liminar e decreto o afastamento cautelar do requerido
MAYCON CESAR ROTTAVA da função de Coordenador Institucional da Força-Tarefa de Intervenção
Penitenciária no Estado no Pará – FTIP/PA", por fim determinou o Juiz Federal JORGE FERRAZ DE OLIVEIRA JUNIOR, da 5ª Vara Federal no Pará.
BOLSONARO E SERGIO MORO MINIMIZARAM TORTURAS
Questionados sobre as graves denúncias feitas pelo MPF, no Pará, em entrevistas, Bolsonaro chamou de "besteiras" e Sergio Moro de "mal entendido".