O juiz da 4. Vara da Fazenda Pública da Capital, Djalma Andrelino, indeferiu pedido do Fiscaliza Brasil, em ação civil pública, para suspender o rodízio imposto por Decreto do governador Paulo Câmara, que intensifica o isolamento social em razão da pandemia.
Segundo o magistrado, "Ao contrário do alegado na inicial, afigura-se que a restrição serve exatamente para desestimular a quebra do isolamento social por indivíduos que não tenham a necessidade premente de sair de casa e que, por isso, não precisarão do transporte coletivo, cujo uso ficará restrito àqueles que, sem ter carro particular, precisem sair, seja por prestarem serviços essências, seja em caso de emergências médicas, ou para outra exceção eventual, afastando a presunção que haverá maior afluxo de passageiros aos meios públicos de locomoção. De outra banda, no que pertine à alegada ausência de previsão legal para o rodizio, entendo que a possibilidade de determinação de quarentena e isolamento social já prevê, para a sua aplicação, a restrição à circulação de veículos como instrumento a ser instituído via regulamentação, por decreto, visto ser medida apta a diminuir a movimentação de pessoas."
Ao Blog, o advogado Saulo Brasileiro, que representa a ONG Fiscaliza Brasil, na ação, informou que recorreu ao TJPE, mas relator do agravo de instrumento indeferiu o pedido de efeito suspensivo.
Leiam a íntegra da decisão:
Processo nº 0022805-12.2020.8.17.2001
REQUERENTE: FISCALIZA BRASIL
REQUERIDO: ESTADO DE PERNAMBUCO, PAULO HENRIQUE SARAIVA CAMARA
DECISÃO
A PARTE AUTORA, associação civil, devidamente qualificada na inicial, ajuíza a
presente ação civil pública visando à suspensão do rodizio de veículos, determinada pelo
art. 5º do decreto estadual nº 49.017/2020.
Alega que a medida em questão não atingirá a finalidade desejada, qual seja, a redução do
contágio da COVID-19, mostrando-se desproporcional de desarrozoada, aduzindo que em
São Paulo, por exemplo, não teria surtido efeito.
Sustenta que a limitação da circulação de veículos particulares acabaria por aumentar a
possibilidade de contágio, pelo incremento do uso de transporte coletivo, que seria um
vetor de transmissão do vírus, dada a aglomeração de pessoas.
Assim, a discrionariedade administrativa não poderia desbordar dos limites da
proporcionalidade, de modo que o ato não deveria ser válido se implicará em resultado
contrário ao buscado pela finalidade pública.
Defende que o decreto em questão teria inovado no mundo jurídico, pois a Lei nº
13.979/2020, com normas para o combate à epidemia, não previu expressamente a possibilidade de
rodizio de veículos.
Assevera que mesmo que fosse possível a adoção do rodizio, a determinação deveria ser
lastreada em pareceres técnicos da vigilância sanitária, o que não teria se dado no caso.
É a suma.
De início verifico a legitimidade da Autora, constituída há mais de um ano para a tutela
dos direitos difusos relativos à liberdade de locomoção e à saúde pública, bem como, a
princípio, constato a natureza incidental do pedido de declaração de constitucionalidade.
Quanto ao mérito da liminar, observo que a análise de razoabilidade e proporcionalidade
da medida impugnada não pode ser feita em sede de cognição sumária, sem a oitiva da
parte adversa, notadamente, tendo em vista a presunção de legitimidade dos atos
administrativos, sobretudo, aqueles adotados em estado de calamidade, como na hipótese
dos autos.
O decreto questionado ressalva a não aplicação do rodizio para o uso dos veículos
particulares em casos considerados essenciais, pela autoridade pública:
§ 2º O rodízio de que trata este artigo não se aplica:
I - aos veículos utilizados para obtenção de atendimento ou socorro médico;
II - aos veículos utilizados pelos profissionais da área de saúde, segurança
pública e imprensa, no exercício de suas funções;
III - aos veículos utilizados pelos servidores públicos que prestam serviço
essencial e presencial nas áreas de saúde, segurança pública e assistência social,
conforme declaração cujo modelo consta do Anexo III;
IV - aos veículos utilizados na prestação de serviços de socorro a incêndio e
salvamento, fiscalização e operação de trânsito e ambulâncias;
V - aos veículos utilizados na prestação de serviços de abastecimento e
distribuição de água, gás, saneamento, coleta de lixo, energia, telecomunicações e
internet, devidamente caracterizados;
VI - aos ônibus e táxis;
VII - aos guinchos e veículos utilizados para reboque, controle e ordenamento do
trânsito;
VIII - às motocicletas e similares, destinadas a entregas em domicílio;
IX - aos veículos destinados a serviços funerários;
X - aos veículos de uso oficial pela União, Estado e Municípios, incluindo
entidades e empresas da Administração Indireta, na prestação de serviços essenciais;
XI - aos veículos utilizados por membros de Poder, do Ministério Público e do
Tribunal de Contas, no exercício de suas funções;
XII - aos veículos de transporte de:
a) combustível;
b) insumos e cargas diretamente ligados a atividades hospitalares, de sangue
e derivados, de órgãos para transplantes e de material para análises clínicas e a serviços
farmacêuticos ; c) de valores, devidamente autorizados pelo Departamento de Polícia
Federal;
d) de transporte de produtos alimentares, inclusive para supermercados,
mercados, feiras livres, açougues, peixarias, hortifrutigranjeiros, quitandas, centros de
abastecimento de alimentos, lojas de conveniência, lojas de venda de água mineral e
padarias;
XIII - aos veículos destinados à manutenção e conservação de elevadores,
devidamente autorizados para a prestação deste serviço;
XIV - aos veículos utilizados pelas pessoas que trabalham em instituições
financeiras e afins, que estejam prestando serviço de pagamento dos benefícios
emergenciais decorrentes da pandemia do coronavírus.”
Como se percebe, as ressalvas alcançam um amplo espectro de pessoas, cuja locomoção
por meio de veículos automotores é essencial para a manutenção dos serviços básicos ou
para prestação de socorro médico, inclusive com uso de táxis, em caso de hipótese não
prevista no decreto.
Ao contrário do alegado na inicial, afigura-se que a restrição serve exatamente para
desestimular a quebra do isolamento social por indivíduos que não tenham a necessidade
premente de sair de casa e que, por isso, não precisarão do transporte coletivo, cujo uso
ficará restrito àqueles que, sem ter carro particular, precisem sair, seja por prestarem
serviços essências, seja em caso de emergências médicas, ou para outra exceção eventual,
afastando a presunção que haverá maior afluxo de passageiros aos meios públicos de
locomoção.
De outra banda, no que pertine à alegada ausência de previsão legal para o rodizio, entendo
que a possibilidade de determinação de quarentena e isolamento social já prevê, para a sua
aplicação, a restrição à circulação de veículos como instrumento a ser instituído via
regulamentação, por decreto, visto ser medida apta a diminuir a movimentação de pessoas.
Ademais, os estudos técnicos que supostamente estariam ausentes são objeto de pedido de
exibição, não podendo fundamentar, sem oitiva da parte adversa, a invalidade do ato.
Ante o exposto, por não verificar a ocorrência de qualquer dos pressupostos para tutela de
urgência ou mesmo para qualquer medida cautelar, indefiro o pedido de provimento
provisório.
Intime-se o Réu para, em três dias, juntar os autos os documentos técnicos requeridos.
Intime-se o Ministério Público.
Cite-se.
P.R.I.
RECIFE, 15 de maio de 2020.
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